quinta-feira, março 10, 2005

A carta que nunca te enviarei

Tenho saudades.
Não sei se são tuas, se minhas, se do "nós" ou se simplesmente tenho saudades de um tempo que foi e já não volta mais. Nunca mais.
Sei que tenho saudades porque as sinto. Fisicamente. São tantas e tão fortes que quase se podem tocar. Apertam o peito e a garganta e enchem-me os olhos de lágrimas.
Tenho saudades.
Tenho saudades da forma como te amava. E da forma como me amavas.
Da forma como me completavas.
Tenho saudades até das nossas discussões que acabavam inavariavelmente em cenas de filme... em qualquer parte da casa.
Lembras-te de quando te mostrei a minha casa nova? Estávamos meio zangados. Entrámos como amigos, mas a meio da visita guiada... estreámo-la no tanque que era a única coisa que não estava muito suja.
Tenho saudades da nossa inocência, da nossa capacidade de baixar as defesas, da forma como nos entendíamos.
Tenho saudades do teu cheiro, do teu sorriso, do teu toque, do teu olhar... da tua capacidade de me excitares só com um olhar...

95% do meu tempo é passado sem sequer me lembrar que existes. Os outros 5% estão repartidos... Perco 3% a lembrar-me que existes e 2% a recordar as coisas boas que vivemos. Mas é tudo tão intenso e inesperado que esses míseros dois por cento acabam por desestabilizar os restantes 98%. Merda! Quero esquecer e não posso.

Há quem me fale de ti.
Assim que se soube que estava sozinha outra vez... poucos foram os que não me perguntaram por ti.
"Não sei nem quero saber", digo eu. Que estou zangada, que és uma criança, que és problemático, que és... Porra, que és quem mais me marcou... mas isso nem a mim mesma digo. Não quero estar presa a ti.

Ainda te lembararás de mim?
Pediste-me que não me esquecesse de quem eras... e tu? Esqueceste-te de quem sou?
Quero acreditar que não. Que qualquer coisa te deixei aí dentro. Que nestas alturas em que me lembro de ti assim, é porque tu também te estás a lembrar de mim... com tanta força que me distrais do que estou a fazer e "vejo-te" à minha frente.

Bebo um Gin enquanto te escrevo... por mais que tente nunca ficarão iguais aos teus.

Está a tocar a nossa música.
"Se gostas de Ben Harper vais adorar Lamb!". Tinhas razão.
Como gostava de voltar a esse tempo. Descobrir-te outra vez. Perceber que somos tão iguais.
Voltar ao primeiro beijo. Aos primeiros dias, quando namorávamos meio às escondidas porque nenhum de nós sabia bem o que era aquilo.
Que semana...
Voltar à nossa primeira vez... meio bebidos, é certo, mas... foi nesse dia que tive a certeza que eras tu... e a minha vizinha também.

"Vais fumar antes de ires para o ginásio?".
Foi assim que me apareceste ontem outra vez, mal acendi um cigarro à saída do carro. Tal como apareces nos momentos mais inesperados.
"Achas que tens uma coisinha aqui dentro?" dizias-me tu enquanto me acariciavas a barriga.
Não tinha. Lembras-te de como comemorámos? De como ficámos felizes?

Tenho saudades tuas, mas não quero ter.
Quero arrancar esta plantinha que teima em crescer... tenho de lhe arrancar as raízes e não sei como. Se não o fizer, nunca mais poderei plantar nada neste jardim...
Devia ir-me embora. Não há uma só pedra da calçada desta terra que não me lembre de ti, que não tenha uma história tua... nossa... Mas não consigo... sou mazoquista... caso contrário por que raio teria eu saudades tuas? Por que raio quereria eu manter-me ao teu lado quando te tornaste insuportável?
Não consigo ir embora... mas não consigo viver aqui assim...
Pede por favor ao teu fantasma que me deixe em paz...